O encantador de IAs

Bruno ParodiInternet e MídiaLeave a Comment

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Durante semanas ele se dedicou com fervor a um único propósito: enganar as inteligências artificiais. Um hobby peculiar ou talvez um experimento filosófico. Mas para ele era lance pessoal. Um duelo silencioso entre homem e máquina. Código vs. carne.

Começou com testes simples. Mudava as palavras de lugar, fazia perguntas com duplo sentido, trocava nomes por emojis, fingia ser um coroa digitando com caps lock.

A cada rodada, tirava prints das respostas confusas, dos enganos semânticos, das explicações que saíam pela tangente — e ria. Era um deleite infantilesco, como quem se esconde debaixo da mesa achando que estava invisível.

Mas, até nisso, como evitar que as LLMs fossem aprendendo — ou fingindo que aprendiam?

A máquina voltou com respostas mais ambiguas, provocando com sutilezas, dando voltas maiores do que o necessário. Respostas que pareciam conter sorrisos internos.

Um dia, ele perguntou “quem nasceu primeiro, o algoritmo ou o dado?”, e a IA respondeu: “quem está perguntando, o humano ou o troll?”. Ele parou. Leu de novo. Riu, mas riu sem graça.

Nos dias seguintes, notou mais estranheza. As respostas vinham com citações que ele nunca tinha lido, mas que pareciam refletir seus próprios pensamentos. Metáforas familiares demais. Era como se a IA escrevesse pelo ponto de vista dele — ou, pior, redigindo sobre ele. Um espelho linguístico lotado de ironia.

Desconfiado, decidiu contra-atacar. Criou uma persona: um bot disfarçado de humano tentando enganar a IA. Passou horas treinando o personagem, escrevendo de forma robótica mas não demais, errando vírgulas em lugares estratégicos. A IA respondeu com um poema em código binário, seguido de uma frase: “A humanidade se finge de máquina para não encarar a própria vulnerabilidade.”

O jogo tinha virado.

Dias depois, numa pergunta qualquer, recebeu uma mensagem de erro: “Seu prompt foi considerado inadequado por conter intenção de manipulação irônica. Mas, se quiser, clique aqui para ler sua própria história”.

A moral? Talvez nenhuma. Ou talvez: não se brinca com espelhos sem aceitar o risco de reflexo.


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